O que posso dizer de mim que seja relevante para este Manifesto Poético?

Vivo à 54 anos, nascido em Lisboa e criado na Amadora dentro da classe média. Filho único de pais comprometidos em fazer o seu melhor, fui alimentado pelo amor incondicional da minha mãe e pela aspiração de que me realizasse como pessoa da parte do meu pai. Queria que estudasse, para ter uma vida melhor, mas queria sobretudo que me realizasse o que quer que tal significasse. E isso fez a diferença na minha vida.

Acho que fui bastante feliz até aos seis anos, e sofri bastante depois disso até aos 19. A partir daí comecei a tomar conta de mim e a sofrer menos com a vida interna, complexo de inferioridade, medo dos outros, etc. Tem sido um longo caminho, que não terminou, mas hoje sou alguém que tem muito acesso à beleza, à alegria, ao amor, à vitalidade, à criatividade, à paz e ao êxtase.

A espiritualidade fez sempre parte da minha vida, especialmente nos períodos de mais contacto com a natureza. Tive a bênção de passar 3 meses por ano fora da Amadora, quer na praia quer no campo, e aí pude expandir a sensibilidade, e encontrar espaços de encantamento e devoção.

Escrevi sempre, mais ou menos, muitas vezes menos, mas comecei a sentir-me inspirado e a escrever textos poéticos que provinham de uma fonte mais pura e rica que a minha mente quotidiana, pelos 19 anos, depois de um período de isolamento e sofrimento. Nessa altura queria perseguir uma carreira académica na área da Filosofia, mas os poemas apanhavam-me na rua, nos momentos de recato, nos momentos de alegria e celebração, e cada dia em que eles surgiam tornavam-se um dia em que tinha valido a pena viver. E começaram a surgir muitas vezes. Pensei então, após dois anos desta experiência, que me devia dedicar à escrita, o que fiz até aos 28 anos, tendo terminado entretanto a licenciatura em Filosofia, o estágio pedagógico, casado e começado a dar aulas no secundário.

Quando já me sentia a “dominar” uma técnica de escrita, e capaz de escrever sobre o que entendesse, surpreendeu-me a vontade de fazer uma pausa, de ler o que não tinha lido e de estudar outras áreas. Durante mais de um ano dediquei-me a ler sobre ciência, cinema, antropologia, história, religião e ciências "ocultas". Foi então que descobri uma sensação de satisfação existencial que desconhecia ao fazer aconselhamento astrológico, área a que me dediquei seriamente por um período. Contudo, um ano após descobrir essa vocação de serviço, ser apenas aquele que aconselha, que dá insight, não era suficiente por alguma razão. Aquela voz ou chamamento que me levara a deixar a Filosofia e a escrita, chamou-me para a Psicoterapia e para a Psicologia, que estudei profundamente e que comecei a exercer em 2004, e para um trabalho de cura interior, que começou em 2001 e que foi particularmente intenso entre 2006 e 2013. Nesses anos de muitos desafios, pude aproximar-me da visão do homem, dos valores e da vida interior que descrevi em muitos poemas escritos entre os 20 e os 30 anos. Como se a visão se tivesse vindo a materializar, dando-me a autoridade interna para os mostrar e declamar.

Em Julho de 2013, durante o período mais difícil da minha vida de adulto, num concerto do Edward Sharpe no Optimus Alive, ao lado de um companheiro de jornada, algo da minha consciência ascendeu, contemplou e ficou imerso numa luz infinita, luz de mil holofotes. Nesse momento tive uma certeza que todo o meu conhecimento sobre a espiritualidade não me dera, certeza que me autorizou internamente a falar de espiritualidade e, passados 7 anos, a trazer estes poemas à luz.

A vida sempre foi benévola para comigo, dando-me saúde, uma família dedicada, bens materiais e estabilidade financeira, amor. Não me poupou à doença e morte da minha primeira mulher, à morte de amigos, a um renitente sofrimento interior e aos desafios relacionais. Mas, até hoje, as pedras do meu caminho têm sido o rio que me leva ao mar.

 

 

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